HISTÓRIA DA SANTA CASA: (Conto de Luiz Carlindo Arruda Kastein, baseado em registros de livros da Santa Casa)
Descalvado em 1891 era governado por um Conselho Consultivo, sob a presidência do Dr. Anastácio Vianna, já que dois anos antes em 1889, com a Proclamação da República, o Marechal Deodoro da Fonseca havia dissolvido as Câmaras Municipais. Dentre os membros do Conselho, figurava o nome de Francisco de Paula Carvalho, homem profundamente religioso e que aproximou ainda mais seus vínculos com a Igreja de Nossa Senhora do Belém a partir de seu casamento com a irmã do Pároco Francisco Teixeira de Vasconcellos Braga. Os registros não constam onde nasceu Paula Carvalho, mas sabemos a data: 23 de dezembro de 1842. Em 1846, ainda criança veio para Descalvado. Um fato preocupava muito a este homem. A cidade possuía meia dúzia de hotéis e cinco padarias, quinze armazéns na cidade e dezessete nas fazendas, duas tipografias, três fábricas de cerveja, duas bandas marciais, quatro clubes, quatro escolas, quatro farmácias, dois bilhares e quarenta e quatro tabernas, mas nenhum hospital. E o que era pior, vínhamos do grande surto da febre amarela, que em 1885 obrigou a construção do novo cemitério, mais afastado da cidade, o mesmo de hoje. Existia ainda na entrada da cidade, ao lado da ponte do Ribeirão Bonito, o “Lazareto” retiro de doentes que costumavam coletar esmolas, daqueles que chegavam à cidade, com canecas na mão, daí a alcunha dada aos descalvadenses de “canequinhas”. Francisco de Paula Carvalho, possuía um estabelecimento comercial na então Rua Uruguayana (atual Cel. Rafael Tobias, havendo controvérsia se na esquina com Barão do Descalvado ou José Bonifácio), ponto obrigatório de palestras dos homens da melhor sociedade descalvadense da época. Corria o mês de abril de 1891, estavam reunidos Paula Carvalho, Cel. Antonio Alves Aranha, Major Arthur Horácio D’Aguiar Whitaker, Antonio Augusto Bezerra Paes e José Rodrigues Penteado, quando o primeiro deu a idéia de se fundar uma casa de refúgio aos enfermos pobres, e ficou combinado de levarem adiante a idéia. Tão fundo se fez sentir neles o desejo de pôr em prática o plano, tão convictos se achavam de que podiam contar com o apoio de muitos outros, que desde logo se lançaram a campanha, que em pouco tempo oferecia resultados animadores. Paula Carvalho, propugnador da obra, doou o terreno e elevada quantia em dinheiro, promoveu a construção do edifício e dirigiu o serviço até o fim. O belo prédio leva fortes traços de engenharia maçônica, embora Carvalho, católico fervoroso e cunhado do Pároco, com toda certeza não pertencesse à Ordem. Naquela época maçonaria e igreja trilhavam caminhos opostos. Em 8 de setembro de 1894, a convite da comissão de iniciativa, reuniram-se muitas pessoas a fim de deliberar sobre a formação de uma sociedade que se incumbisse de gerir os negócios da instituição, cabendo a Presidência ao Cônego Elisiário Martins Pedroso, outro benemérito da terra descalvadense. Nesta memorável Assembléia declararam constituída a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Descalvado, nomeando-se uma comissão para elaborar os seus estatutos, para cuja composição foram proclamados o sacerdote Pedroso e os doutores Alencastro Reis e Amâncio Penteado. Antes de encerrarem a sessão com justiça inseriram em ata a gratidão aos cinco membros da comissão de iniciativa. Quase um ano depois, em 2 de junho de 1895, houve nova reunião, na qual foram aprovados os estatutos e eleita a primeira Mesa Administrativa, cujo mandato durou desde então, até o final do ano seguinte, ficando assim constituída:
Provedor – Francisco Paula Carvalho
Secretário – Dr. Amâncio Penteado
Tesoureiro – Landulpho Bezerra Paes
Procurador – Severiano João da Cruz
Mordomos – Francisco de campos Serra, José Mariano de Faria, Joaquim Martins Pimenta, Major Arthur Whitaker, Sérgio Arruda Campos, Joaquim Cândido Filho, Cel. Antonio Alves Aranha e José Rodrigues Penteado. Em 31 de agosto do mesmo ano, o Provedor Paula Carvalho, angariou mais donativos, para a montagem do Hospital.
Toda a obra orçou oitenta contos de réis, quantia vultuosa para a época. Depois de tudo organizado, fez entrega à Mesa Administrativa, que começou a exercer as suas funções, inaugurando o Hospital com a entrada do primeiro doente em 4 de novembro de 1895. Paula Carvalho, veio a falecer em pleno exercício do cargo de Provedor, com apenas 54 anos, em 13 de junho de 1896. Está enterrado no jazigo de nº 4, do lado direito da ala principal de entrada de nosso Cemitério. Para completar o mandato de Paula Carvalho, foi escolhido José Rodrigues Penteado, outro vulto de projeção na vida municipal, o qual, reeleito, exerceu a provedoria até 1897. A Santa Casa funciona no prédio edificado por Paula Carvalho, na Avenida Bom Jesus nº 381 até hoje. Por volta de 1960, os dirigentes da Irmandade da Santa Casa, iniciaram a construção de uma nova ala, que foi concluída em 1973. Em 1982 foi inaugurada a maternidade. Para escrevermos esta história, pesquisamos os primeiros livros da Santa Casa de Misericórdia e de sua Irmandade, atas da Câmara Municipal, jornais da época, e artigos deixados pelos historiadores, Prof. Gerson Álfio De Marco e Antenor Betarello e pelos jornalistas Mário Joaquim Filla Paulo Belli e Milton Timótheo do Amaral. Nenhum registro fixa o ano de 1893, data inserida na frente e ao alto do prédio da Santa Casa, até hoje. O início da construção ocorreu em 1891, a constituição da Irmandade em 1894, a entrada do primeiro doente em 1895, com o prédio ainda em construção.
AS IRMÃS FRANCISCANAS E A ASSISTÊNCIA HOSPITALAR:
Estreitamente vinculada à vida da Santa Casa, está a Congregação das Irmãs Franciscanas do Coração de Maria. pelo muito que tem feito em prol da assistência hospitalar em Descalvado. Desde o início do século prestam serviços ao hospital, quando em 1904 a fundadora da Congregação, Madre Cecilia do Coração de Maria, aceita o pedido da Mesa Administrativa da Santa Casa e envia a primeira Comunidade para assumir a direção interna do hospital. No livro do tombo da Congregação há o seguinte registro: “Aos 20 de fevereiro de 1904, chegou a Revda. Madre Cecília do Coração de Maria, Fundadora e Superiora Geral da Congregação, a quem a Mesa Administrativa propunha tomar a direção interna da Santa Casa. Vinha acompanhada da Irmã Canuta e de uma menina educanda do Lar-Escola Coração de Maria, Cesira Maria Graciano, que mais tarde entrou para a Congregação, recebendo o nome de Irmã Clara. Hospedaram-se em casa do padrinho de Madre Dorotéia, ao que parece Capitão João Nunes, enquanto se preparava o hospital. Aos 22 do mesmo mês, a Madre Cecília aceitou a direção, assumindo ela mesma, o cargo de Superiora, para o que viajava diversas vezes entre Piracicaba e Descalvado, trazendo as irmãs para o serviço.” Descalvado, portanto, depois de Piracicaba, foi a primeira cidade que sentiu a influência benéfica do coração apostólico da Madre Fundadora e suas filhas espirituais